Tolerância e Direitos Humanos
José Gregori
O tema desse colóquio é Tolerância e Direitos Humanos: diversidade e paz. E pediram-me para falar sobre Direitos Humanos. Aqui com a qualificação das pessoas presentes, seria redundante falar de Direitos Humanos. Mas há uma reflexão que deve fazer parte da reunião. Nesse auditório há, pelo menos, duas certezas: são 18h45min da manhã e hoje é dia 26 de abril do ano 2009. Pois nesse minuto exato: nesse mundo, vasto mundo, 12 crianças estão morrendo de fome, 1pessoa esta morrendo por arma de fogo ou outro meio violento; 60 milhões de crianças estão morando nas ruas; cerca de 132 milhões de pessoas estão com instrução superior completa enquanto 750 milhões de adultos não sabem ler ou escrever; 1 pessoa esta morrendo ou se ferindo em combates políticos ou religiosos em diversas regiões do mundo; mais de 800 milhões de pessoas vão se deitar hoje, como todas as noites, com fome; dentre elas, 300 milhões são crianças; 10.415 toneladas de alimentos estão sendo produzidas; 13.888 pessoas estão jogando golfe; 24.424 é o numero de idas ao cinema nesse minuto exato; 28 milhões de pessoas estão presas em prisões, penitenciarias ou ainda em liberdade condicional. Nesse quadro em que procurei panoramisar o mundo em que vivemos, emerge a desigualdade, a diversidade, o conflito. Perante ele, com ele, e por ele é que desejaria indagar sobre o papel dos Direitos Humanos. Que papel seria esse?
É claro que sempre houve na história da criatura humana em sociedade imensa diversidade. O que faz a diferença com nossos dias atuais é que tudo se massificou. Tem mais e mais gente fazendo coisas diferentes, opostas, contrastantes. Assim, repita-se a pergunta: Os direitos humanos, nesse redemoinho caleidoscópico, teria um papel a cumprir?
A resposta, a meu ver, é sim, teria um papel. E isso porque é um dos poucos mecanismos que tornam basicamente convivível tanta diferença. É necessário o respeito mínimo entre todos. É necessária, também, a aceitação das diferenças. Do contrário, teremos o caos, a luta e a violência. Na medida em que os valores que consubstanciam os direitos humanos se interrealizam, aumenta a taxa de tolerância em cada membro da sociedade.
Diminui a agressividade, aumenta a solidariedade. A criatura humana afasta-se de Hobbes e já não é o "lobo do homem".
O problema, finalmente, é como conseguir energisar, ou melhor, potencializar os direitos humanos de modo a eles realmente estimularem, demarcarem, condicionarem a conduta humana.
Ninguém nasce com esse condicionamento. É preciso construí-lo em cada um de nós. Mil fatores influem na maior ou menor possibilidade dessa construção interna.
Se tivesse uma vacina... Não tem. É preciso trabalho, esforço, persistência, estímulo.
Parece-me que ideais com o museu da intolerância que, no fundo, é a materialização da Declaração Universal dos Direitos Humanos, ajudou. Seminários como esse, ajudam. Mas não são suficientes. É preciso espalhar os Direitos Humanos em todos os níveis, em todos os lugares, em todas as ocasiões e sob todos os pretextos.
* Foi Ministro da Justiça (2000-2002) e Embaixador do Brasil em Portugal (2002-2003). Recebeu o Prêmio das Nações Unidas para área de Direitos Humanos da ONU (1998) e o Prêmio Criança e Paz – Betinho da UNICEF (1998). Atualmente é Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Prefeitura de São Paulo.