DISCIPLINA: HDL5028 – Os Mitos de Origem Ameríndios: o caso dos Boe (Bororos) e os Bakaru

Docentes: Aivone de Carvalho Brandão

                   Marília Librandi-Rocha

                   Sérgio Bairon

Início: 05 de março de 2020

Dia da semana: quintas-feiras

Horário: 15h00 às 19h00

Locais: A disciplina mesclará atividades a distância, presenciais na Aldeia Meruri e na Casa de Cultura Japonesa  – Cidade Universitária

Nº de Créditos: 08

 

PROGRAMA

 

Objetivos

A disciplina visa estudar os modos de transmissão dos mitos nas comunidades indígenas, em especial na etnia Boe-Bororo onde são nomeados Bakaru. A disciplina contará com a parceria de professores bororo da Escola Estadual de Meruri. A questão central que propomos versa sobre a importância das presenças dos mitos no contexto das aldeias indígenas, mas também no interior das pesquisas acadêmicas nas áreas de Ciências Sociais e Humanas. Pata atingir tal objetivo promoveremos o encontro entre, de um lado, as narrativas indígenas, sobretudo dos chamados “mitos de origem” e de outro lado, a forma como este conjunto de narrativas foi registrado na bibliografia especializada. O caminho da abordagem seguirá a metáfora do caleidoscópio, de Claude Lévi-Strauss, desenvolvida como forma da expressão da trajetória reticular e não-linear de formação do pensamento selvagem. Ou seja, basta deslocamento sutil para que a rosácea/rede de cacos coloridos se desconstrua e dê origem a uma nova configuração.

 

Justificativa

Os “mitos de origem” podem ser compreendidos como um conjunto de sentidos compartilhados, que permite a todos os membros das comunidades indígenas experimentarem um universo simbólico comum. Esta é a condição primeira para que a comunicação aconteça como base dos diálogos práticos da vida social.  Eduardo Viveiros de Castro definiu, por exemplo, o universo simbólico Bororo como “um univer­so cuja grandiosidade metafísica nada fica a dever a cosmologías como a grega ou a chinesa.” E completou: “Os xamãs Bororo (…) são atores em um teatro ontológico, cujo cenário é cósmico”  (Viveiros de Castro: 205 p.87)

Os mitos expressam uma rede de apropriações de sentidos cruzados e circunstanciais. A criação de sentidos, por meio destas narrativas, é a maneira de praticar essa apropriação, e o cotidiano, seu palco de temporalidades sobrepostas. É esta característica que delega às narrativas míticas uma impossibilidade de serem fixas, pois estas estão sempre em movimento reatualizando temporalidades diversas.

O resultado é que a disciplina possibilitará uma produção partilhada de conhecimento no interior de um conjunto reticular de conversações e convivências, equiparando conceitos e estéticas acadêmicas à oralidade e corporeidade das formas de vida ameríndias. Trata-se da soma da transformação de dois modos de vida já arcaicos: de um lado, o acadêmico que não olha mais para as comunidades como “fontes documentais”, mas como parceiros; do outro lado, o saber centenário do conhecimento ameríndio, corporificado nas narrativas performáticas, que será explorado por meio da vitalidade de suas dimensões epistemológicas já acostumada a domesticar as técnicas. Explorar as características do modo de ser da compreensão heterárquica na forma como tem sido construída na contemporaneidade, ou seja, baseada muito mais no escutar do que no falar, na casualidade, do que no previsto, no equívoco, do que no inequívoco, na busca, do que na conclusão, e no desvio, do que no retilíneo. A comunicação heterárquica desenvolve expressividades da linguagem que sempre estiveram presentes no modo de ser do cotidiano e das narrativas míticas.

 

Conteúdo

05/03 – Os mitos de origem como forma de expressão das singularidades culturais ameríndias

12/03 – Os mitos de origem como forma de expressão das singularidades culturais ameríndias

19/03 – Os mitos de origem como forma de expressão das singularidades culturais ameríndias

26/03 – Os Bakaru (origem) Boe-Bororos

02/04 – Os Bakaru (origem) Boe-Bororos

09/04 – Os Bakaru (origem) Boe-Bororos: cruzamentos das narrativas locais com a bibliografia especializada

16/04 – Os Bakaru (origem) Boe-Bororos: cruzamentos das narrativas locais com a bibliografia especializada

23/04 – Os Bakaru (origem) Boe-Bororos: cruzamentos das narrativas locais com a bibliografia especializada

30/04 – Os Bakaru (origem) Boe-Bororos: cruzamentos das narrativas locais com a bibliografia especializada

07/05 – O encontro entre bibliografia e a tradição oral: caminhos reticulares

14/05 – O encontro entre bibliografia e a tradição oral: caminhos reticulares

21/05 – Encerramento Apresentação dos Trabalhos Finais

 

Forma de Avaliação

Sistematização bibliográfica e montagens audiovisuais, participações e apresentações de experiências estéticas. Entrega do trabalho final, abordando a escolha de uma temática apresentada e a pesquisa desenvolvida no contexto (pós-graduação) do Diversitas.

         

Bibliografia:

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